Estudo vê "manipulação" de "Diários Oficiais"
Publicações na internet não garantem a cidadão acesso a informações de interesse público, diz pesquisa da Transparência Brasil
Levantamento constata exemplos de uso dos jornais oficiais para promoção de governadores, o que é proibido pela Constituição
FREDERICO VASCONCELOS
DA REPORTAGEM LOCAL
O acesso a informações de interesse público nas versões eletrônicas dos "Diários Oficiais" é dificultado na maioria dos Estados pelo descaso das autoridades com um direito assegurado ao cidadão, revela estudo da ONG Transparência Brasil.
Em vários estados, os governantes usam esses veículos para fazer propaganda pessoal, o que é proibido pela Constituição Federal, mas não é coibido pelo Ministério Público.
"Em relação à prestação de contas para a sociedade, a maioria funciona conforme o paradigma -e a mentalidade- inaugurado por Johannes Gutenberg há mais de quinhentos anos", diz Cláudio Weber Abramo, diretor executivo da ONG, ao citar o alemão que inventou as técnicas de impressão. O estudo examinou as edições referentes ao poder executivo e recebeu o título: "Gutenberg em bits - Breve panorama dos Diários Oficiais brasileiros".
Segundo Abramo, o desenvolvimento dos meios eletrônicos trouxe apenas uma "modernidade cosmética". Na quase totalidade dos Estados, "a única diferença entre o "Diário Oficial" impresso e o apresentado na rede é o suporte: em vez do papel, a tela do monitor. Uma das exceções é Alagoas, cujo "Diário Oficial" eletrônico organiza as informações. Mas o órgão abriga noticiário com promoção pessoal do governador tucano Teotonio Vilela Filho. O mesmo ocorre com o "Minas Gerais", que publica propaganda pessoal do governador Aécio Neves (PSDB).
Em alguns estados, as Imprensas Oficiais condicionam o acesso ao pagamento de assinaturas, a título de ressarcimento dos custos. "Não sendo importante para custear a produção dos "Diários Oficiais", na prática a cobrança representa um obstáculo ao acesso", diz Abramo.
O "Diário Oficial" não é publicado na internet nos Estados de Goiás, Rondônia, Roraima, Sergipe e Santa Catarina. No Amapá, deixou de ser publicado na internet em agosto último. O de Minas Gerais só é disponível mediante pagamento.
Quando o acesso é gratuito, costuma ser limitado a poucas edições (uma semana ou um mês). Nos poucos casos em que se pode consultar edições anteriores, o cidadão tem que pagar.
Essas limitações dificultam pesquisas sobre licitações e nomeações para cargos comissionados a cada novo governo.
"Em alguns "Diários Oficiais", a interface de uso é bisonha, com excesso de passos de navegação, uma diagramação primitiva e funcionamento precário", diz o estudo da ONG.
Segundo Abramo, "demasiados agentes do poder público não se dão conta da importância de informar a população a respeito de seus atos". "Só isso pode explicar o fato de "Diários Oficiais" como os de São Paulo e Rio de Janeiro, por exemplo, omitirem ao internauta a possibilidade de fazer buscas livremente em suas edições."
"A indigência da maioria dos "Diários Oficiais" sequer poderia ser completamente justificada sob o argumento de que seu aperfeiçoamento sairia caro demais", diz Abramo. As imprensas oficiais contam com receita da obrigatoriedade de publicação de atos e declarações de entes públicos e privados. "O custo de publicação é muitas vezes verdadeiramente extorsivo se comparado com o mercado publicitário", afirma.
É possível que a receita seja insuficiente para custear a produção do "Diário Oficial" e a melhoria das edições eletrônicas, mas "os governos contam em seus orçamentos com nutridas verbas de publicidade", contrapõe o estudo da ONG.
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