sexta-feira, 19 de setembro de 2008

Namorar é preciso!

Extraído de: http://revistavivasaude.uol.com.br/edicoes/65/artigo99797-1.asp

Namorar é preciso...

Em tempos de sexo sem compromisso e relacionamentos instáveis, uma nova corrente de estudiosos chama a atenção para os benefícios de dar e receber afeto. Segundo os especialistas, o bem-estar proporcionado por uma união de cumplicidade diminui o estresse, dá uma força ao sistema imunológico e ainda garante mais disposição para as outras atividades do dia-a-dia

(REPÓRTER: RITA TREVISAN)

"Amar é, acima de tudo, dar um presente a si mesmo", já dizia o escritor francês Jean Anouilh, no século passado. A novidade é que, mais recentemente, vários estudiosos ligados às áreas da Medicina e da Psiquiatria têm se esforçado para provar que a frase não só faz sentido como deve servir de incentivo para que os casais namorem mais e melhor. "Ultimamente, a maioria das pessoas vem privilegiando as vantagens da vida sexual e prescindindo do namoro. É claro que sexo é muito bom, porém sexo com intimidade é muito melhor", defende a professora de Psiquiatria e colunista da Viva Saúde Carmita Abdo, que também é coordenadora do Projeto Sexualidade (ProSex) do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da USP.

A socióloga e educadora Silvana Barolo, que atua há muitos anos na área de RH, tratando com especial cuidado a questão da afetividade e da sexualidade, fundou a ONG S.A.B.E.R. (Saúde, Amor, Bem-Estar e Responsabilidade) justamente com o objetivo de alertar a sociedade sobre a importância de dar atenção a essas áreas específicas do desenvolvimento humano. A associação, que acaba de completar um ano, reúne uma equipe multidisciplinar e presta atendimento gratuito. "Nossa meta é ajudar casais a despertarem para eventuais problemas, além de orientá-los sobre como encontrar soluções, visando a uma melhora na qualidade de vida", explica. Ela defende que, para garantir boa saúde, é preciso dedicarse mais ao namoro. "Gastamos 99% do nosso tempo com os compromissos profissionais ou com as outras atividades que fazem parte da rotina - como cuidar dos filhos e administrar a casa. Sobra muito pouco para a afetividade e a sexualidade", analisa Silvana, que reúne essas e outras reflexões no livro Namoro é saúde, do qual é co-autora.

Sexo é qualidade de vida

A própria Organização Mundial da Saúde (OMS) já considera a sexualidade saudável como um dos quatro principais indicadores de qualidade de vida de uma população. Nessa dimensão de sexualidade, estão envolvidos o afeto, a comunicação, o carinho e o erotismo. "A pessoa sexualmente realizada tem mais auto-estima, o que reflete em uma dose extra de energia e determinação. Por isso, dizemos que namorar é saúde", diz Silvana.

Na pesquisa Mosaico Brasil - uma investigação conduzida pelo ProSex e patrocinada pelo laboratório Pfizer -, a maioria dos mais de 1.700 entrevistados no Rio de Janeiro e em Minas Gerais consideram o sexo importante ou muito importante para a harmonia do casal. "Usufruir do prazer sexual faz bem. Porém, se o casal puder, além de aproveitar essas sensações, dividir um projeto de vida e ter uma relação de cumplicidade, os benefícios para a saúde serão muito maiores", confirma Carmita. Ela diz que o afeto e o carinho oferecem uma sensação de bem-estar capaz de melhorar até as respostas do sistema imunológico. "Pessoas que se sentem amadas e queridas respondem melhor às situações de estresse e, com isso, se mostram mais resistentes a doenças", garante.

Toque que acalma

Diversos estudos no mundo todo têm se dedicado a provar que o afeto realmente traz benefícios tanto à saúde física quanto à mental. Um exemplo é a pesquisa recém-divulgada, e conduzida por uma equipe de neurocientistas da Universidade de Virgínia, nos EUA. Ela oferece indícios claros de que um simples toque da pessoa amada pode reduzir sensivelmente as reações de estresse do organismo diante de uma situação inesperada.

O experimento envolveu 16 casais e, para a realização do teste, as mulheres entraram em tubos de ressonância magnética e suas imagens cerebrais foram monitoradas enquanto recebiam uma leve descarga elétrica no tornozelo. A resposta natural do organismo foi o aumento da atividade cerebral nas regiões que envolvem as emoções de dor e medo. Num segundo momento, os especialistas analisaram as reações dessas mesmas mulheres ao sentirem que seus parceiros as seguravam pelas mãos. O exame mostrou baixa significativa nas respostas negativas antes desencadeadas pelo corpo.

A conclusão dos pesquisadores não poderia ser mais animadora: o toque de uma pessoa com quem se tem uma relação de afeto é capaz de diminuir a atividade dos hormônios relacionados ao estresse, melhorando, até mesmo, a capacidade de reação do sistema imunológico.

Afeto: modo de usar

Para aproveitar todos os benefícios dessa terapia, no entanto, é preciso que o casal esteja em sintonia e, principalmente, que saiba driblar os desafios que a vida moderna impõe. Para o ginecologista e sexólogo Gerson Lopes, que também é autor do livro Namoro é saúde, um dos principais problemas é a falta de intimidade. Em primeiro lugar, porque ela pressupõe encontro físico, diálogo, troca. O que, na rotina corrida, fica cada vez mais complicado. Por outro lado, não basta só estar junto, ocupando o mesmo ambiente físico, para alcançar a tão sonhada sintonia. "Intimidade é muito mais do que simplesmente estar lado a lado. E a vida moderna dificulta ainda mais as coisas. Mesmo quando estão a sós, os casais estão expostos aos inimigos tecnológicos, como eu costumo chamar a TV, a internet ou o celular. É preciso separar um momento em que o casal possa estar realmente disponível um para o outro", diz.

Na vida de um jornalista e de uma gerente da área de eventos, a falta de tempo é um obstáculo e tanto. "Trabalhamos muito e, para piorar, nossos horários não coincidem. Mesmo nos dias de folga, fico com o rádio ligado para resolver eventuais problemas", conta Ana Carolina de Figueiredo Freire, de 30 anos. Só nos cerca de 10 minutos em que estivemos conversando, durante essa entrevista, a profissional foi solicitada duas vezes. E adivinhe? Estava fora do seu horário de trabalho. O namorado garante que já se acostumou com a rotina corrida. "A gente tenta se encontrar no meio do caminho entre a minha casa e a dela, nos intervalos do trabalho. Também acordamos mais cedo para caminhar no parque, aproveitamos todas as oportunidades para ficar juntos", conta Francisco Prado, de 33 anos.

A parte boa dessa história é que, desde que começaram a namorar, há dois anos e três meses, os dois conseguiram uma melhora sensível na qualidade de vida. "Eu sempre gostei de caminhar no parque, mas, agora que tenho companhia, me sinto mais estimulado. Comecei a correr e me sinto mais resistente, tenho disposição durante o dia e até durmo melhor", diz o jornalista. Para Ana Carolina, os encontros no parque são também uma oportunidade de desacelerar e reduzir o estresse. "A gente aproveita para conversar, tomar uma água-de-coco, é o nosso momento de relaxar."

Desafios para vencer a dois

Mas o dia-a-dia atribulado não é o único obstáculo para quem quer namorar - independentemente do estado civil. "Estou convencida, pela experiência que tenho com casais, que a maioria dos problemas, incluindo os sexuais, acontece pela simples falta de diálogo. É ela que faz os casais se separarem, às vezes, por problemas pequenos", afirma Silvana Barolo. Ela acredita que, hoje, muitos relacionamentos acabam sem que seja feito um mínimo investimento. "As coisas importantes não são conversadas e, quando o casal se dá conta, é tarde demais", alerta.

"Pessoas que se sentem amadas e queridas respondem melhor às situações de estresse e, com isso, se mostram mais
resistentes a doenças"

Carmita Abdo, psiquiatra

Para a especialista, mesmo as preferências sexuais precisam estar bem claras para que o casal realmente se entenda sob os lençóis - e até fora deles. "A sexualidade interfere na vida afetiva e vice-versa. Por isso, é interessante que o casal converse sobre tudo. Isso inclui contar ao outro o que dá mais prazer, onde é mais gostoso e o que é ruim. E importante: ao falar do que não gosta, explique os seus motivos, para que o parceiro não entenda como pura rejeição à maneira dele de atuar sexualmente", ensina a educadora.

Além de separar um tempinho para paparicar seu parceiro e investir em conversas sinceras, outra dica dos especialistas para manter o namoro sempre em dia é abusar da criatividade. "O ideal é que os dois se comprometam a resgatar o clima do namoro, o que pressupõe buscar alternativas para sair da rotina", diz Lopes.

Raio-X do beijo



O simples contato dos lábios apaixonados pode causar uma verdadeira revolução em todo o organismo. Tudo começa com o coração batendo acelerado e a ativação da circulação sanguínea (1).

As mãos podem ficar úmidas graças à transpiração excessiva (2). "Há uma ativação do sistema nervoso autônomo simpático e a conseqüente liberação de adrenalina na corrente sanguínea, o que causa todas as reações relacionadas à ansiedade e ao estresse (3). isso por conta da expectativa em relação ao momento do primeiro beijo, na medida em que a pessoa não sabe muito bem como fazer aquilo, ou seja: beijar", explica o médico e psicoterapeuta Geraldo possendoro, professor de medicina comportamental da Unifesp.

Com a intimidade, o efeito da ansiedade vai diminuindo e há uma predominância das sensações de prazer. isso porque, num segundo momento, o sistema nervoso autônomo parassimpático é estimulado e ocorre uma liberação de dopamina em uma região do cérebro chamada núcleo accumbens, que é conhecido como o "centro do prazer" (4). "esse hormônio é responsável pela sensação de relaxamento e bem-estar proporcionada por um beijo na boca, assim como por todas as situações de prazer que vivenciamos no dia-a-dia", diz o médico.

Alguns casais, mesmo estando há muito tempo juntos, garantem que há meios de manter a relação bem longe do marasmo. A auxiliar contábil Débora Cristina R. Michelon, de 45 anos, e o contador Carlos N. de Souza Michelon, de 54, completaram 27 anos de casados. E garantem que o romance em casa continua de vento em popa. "Durante muito tempo, nos dedicamos bastante aos nossos filhos, que hoje estão adultos. Mas nunca deixamos de namorar. Agora, é a nossa chance de voltar a sair juntos, pegar um cineminha e até mesmo um motel. Por que não?", conta Débora, que já é avó.

Há 13 anos, o casal trabalha junto, numa parceria que não pára de dar bons frutos. "O segredo é ter planos, não se esquecer de beijar, de abraçar, de dizer o quanto a outra pessoa é especial. E, nos momentos de crise, ter paciência e saber dizer o que a está magoando.", ensina. Para Carlos, a oportunidade de namorar mais, nessa fase tranqüila da vida, trouxe saúde e disposição. "É muito bom ter uma relação de cumplicidade. Esse é um grande estímulo para vencer os problemas, viver mais e melhor", resume.

Recomeçar é possível

A exemplo do casal Carlos e Débora, muitos outros redescobrem, já na idade madura, quando os filhos saem de casa, o prazer de namorar. Mas, para isso, é preciso que o casal ainda mantenha certo nível de intimidade e carinho, que não pode ser perdido ao longo dos anos. "Os amantes maduros são os que podem vivenciar prazeres e emoções intensas e plenas, mas ao mesmo tempo seguras e calmas", diz um trecho do livro Namoro é saúde.

Mais de 70% dos entrevistados na pesquisa Mosaico parecem partilhar dessa mesma opinião. Eles afirmaram não ter medo de que a idade atrapalhe seu desempenho sexual. Segundo Carmita Abdo, os avanços da Medicina foram responsáveis por esse novo olhar sobre a sexualidade nas idades mais avançadas. "Hoje, as pessoas vivem mais e com mais qualidade. E, como o sexo depende de uma boa saúde física e mental, os benefícios nessa área também podem ser percebidos", diz. Para o ginecologista Gerson Lopes, o segredo de uma vida sexual plena, depois de certa idade, é investir na qualidade e prescindir da quantidade. "Se necessário for, temos medicamentos capazes de garantir segurança ao casal, para que possam investir no clima erotizante do namoro", diz.

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